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O impacto do Tema 290/STJ na vida do adquirente de boa-fé (prudência redobrada na aquisição de bem imóvel e necessidade de checagem da situação fiscal dos antigos proprietários)

Por Renan Felipe Wistuba - 21/10/2022

O arcabouço jurídico pátrio protege o terceiro de boa-fé sempre que este sofra injusta ameaça constrição do seu patrimônio por dívida alheia. 


A legislação processual inclusive criou um procedimento autônomo para que o terceiro de boa-fé possa se insurgir de forma efetiva quando o seu patrimônio for ameaçado ou constrito por dívida alheia, veja-se a dicção do art. 674, CPC: “Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro”.
 

Contudo, desde o advento da lei complementar federal nº 118/2005 (que alterou o texto do art. 185 do Código Tributário Nacional) inaugurou-se no nosso ordenamento jurídico uma hipótese em que bem imóvel do terceiro de boa-fé pode vir a garantir dívida tributária de antigo proprietário.


Eis a redação atual do art. 185, CTN que permite o vilipêndio ao direito do proprietário atual e terceiro de boa-fé: “Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa”.


O seguinte exemplo permitirá a compreensão do tema:


Em 2010 o sujeito de nome Mévio (que era devedor de tributos inscrito em dívida ativa desde 2009) vendeu o seu imóvel a pessoa de nome Tício. E em 2013 Tício (pessoa hígida, sem dívidas tributárias ou de qualquer natureza) vende o bem para a pessoa de Arcádio. Em 2018, Arcádio (pessoa hígida e sem dívidas de qualquer natureza) vende o imóvel em questão para Augustus. 


E em 2019, Augustus é informado que o bem foi penhorado em razão de execução fiscal contra Mévio (no qual o fisco cobra a dívida inscrita em 2009), primeiro proprietário do imóvel.


Veja-se que nas sucessivas alienações citadas apenas o adquirente Tício sabia da dívida fiscal do primeiro dono do imóvel. As pessoas Arcádio e Augustus adquiriram o bem de pessoa hígida e sem dívidas.


Todavia, pela legislação citada (atual artigo 185, CTN) é possível que o imóvel que atualmente pertence a Augustos (e foi até 2010 de Mévio e que já estava inscrito em dívida ativa quando da venda) venha a responder pela dívida tributária do antigo proprietário Mévio.


Este entendimento decorre do Tema 290 do Superior Tribunal de Justiça que fixou que “basta a efetivação da inscrição em dívida ativa para a configuração da figura da fraude”.


No Recurso Especial que deu lume ao tema citado (REsp  nº  1.141.990/PR) o STJ pacificou que “a natureza jurídica tributária do crédito conduz a que a simples alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, pelo sujeito passivo por quantia inscrita em dívida ativa, sem a reserva de meios para quitação do débito, gera presunção absoluta (jure et de jure) de fraude à execução”.


Embora o entendimento tenha a priori se firmado para avaliar apenas a aquisição direta do imóvel do devedor de tributos inscrito em dívida ativa pelo terceiro de boa-fé (posição jurídica de Tício no exemplo citado), o STJ tem replicado o entendimento para o caso de alienações sucessivas (caso ilustrado anteriormente).


Nesse sentido é o seguinte julgado: “considera-se fraudulenta a alienação, mesmo quando há transferências sucessivas do bem, feita após a inscrição do débito em dívida ativa, sendo desnecessário comprovar a má-fé do terceiro adquirente” (STJ – 2ª T., AgInt no REsp n. 1.825.297/RS, relator Ministro Og Fernandes, DJe de 22/10/2020).


Voltando ao caso hipotético: caso Augustus venha perder o bem imóvel por dívida de Mévio, ele poderá mover ação para cobrar o prejuízo de quem lhe vendeu o imóvel (no exemplo Augustus litigaria com Arcádio). É a chamada aplicação do instituto da Evicção (consagrada nos art. 447 e seguintes do Código Civil).


Todavia, para minimizar os riscos até aqui expostos, a prudência recomenda que na compra de bem imóvel o proponente faça a consulta da situação (ao menos fiscal) de todos os antigos proprietários que constem da matrícula imobiliária  (isto é: consulte o atual proprietário e aqueles que antes foram os donos do imóvel).

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