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Textos jurídicos sobre a COVID-19

COVID-19 – Teoria da Imprevisão e Modificação Equitativa dos Contratos

Por Geandro Luiz Scopel - 31/03/2020

Inegáveis os malefícios econômicos que a pandemia do COVID-19 está trazendo para a maioria dos setores industrias, comerciais, serviços, e que certamente refletirão diretamente nas relações contratuais das mais variadas espécies (energia, saneamento, locações, fornecimento de insumos, etc). No que tange às relações de trabalho, o Poder Executivo vem trazendo algumas alternativas com o objetivo de minimizar os impactos econômicos, a exemplo da MP 927/2020 e do Decreto 06/2020.


Numa interpretação da legislação, pode-se concluir que o contrato é via de regra imutável. Seja porque o artigo 421 do Código Civil regulamenta a liberdade de contratar, a qual deve ser “exercida em razão e nos limites da função social”, seja porque, em 2019, com a Lei nº 13.874/2019 (conhecida como Lei da Liberdade Econômica), o legislador introduziu o parágrafo único ao referido artigo 421, estabelecendo que “nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual”, e o artigo 421-A, em cujo inciso III estabelece a “revisão de forma excepcional e limitada”.


No entanto, o próprio Código Civil, na parte em que regulamenta as relações contratuais no âmbito civil, prevê a chamada teoria da imprevisão (art. 478), possibilitando a qualquer das partes contratantes requerer a revisão (arts. 479 e 480) ou resolução do contrato, em decorrência das alterações das circunstâncias (base econômica objetiva) em que foi firmada a avença, caso isso decorra da superveniência de acontecimento imprevisível.


Há casos em que a pandemia causada pelo COVID-19 se enquadra na possibilidade de revisão ou resolução contratual face à sua excepcionalidade – imprevisão ou até mesmo caso fortuito ou força maior, fato que isenta o devedor de eventuais perdas e danos que der causa – art. 393, do Código Civil. Sendo de conhecimento notório o mal causado em toda a sociedade, seja ele no aspecto da saúde pública ou na economia, em virtude da determinação para o chamado “isolamento social”. A paralisação de variados setores da economia afeta o cotidiano das pessoas e via reflexa a circulação de riquezas, diminui a circulação de receitas e consequentemente pode inviabilizar o cumprimento de compromissos financeiros.


Contudo, apesar das possibilidades e dos mecanismos legais para as negociações contratuais, recomenda-se sejam feitas com parcimônia e ponderação, ou seja, na extrema necessidade do caso concreto, objetivando exclusivamente manter o equilíbrio dos contratos visando à sua preservação, sob pena de se causar, de forma inconsequente e irrefletida, um mal ainda maior que a própria pandemia do COVID-19. No ponto, trazemos os artigos 479 e 480, ambos do Código Civil, que tratam da possibilidade de negociação como vista a preservar a relação contratual. Vejamos a redação: art. 479 - “A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato.” Art. 480 – “Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.” (redação dada pela Lei da Liberdade Econômica).


Com isso, e diante do caos econômico que poderá assolar o País, nota-se que a aplicação da teoria da imprevisão contratual pode levar não somente à rescisão contratual, mas também a sua manutenção mediante modificações equitativas entre as partes, objetivando o cumprimento do pactuado frente à nova realidade da ordem econômica e social, pós pandemia. Certamente, evitar a rescisão contratual implica fiel observância ao princípio da função social do contrato e, dependendo da situação, da própria atividade empresarial – preservação das empresas.


O que se recomenda é a priorização da manutenção das relações contratuais, evitando-se um mal maior e um possível colapso no meio econômico e social que pode advir do não cumprimento dos compromissos assumidos.


Neste contexto, o vivenciado nos dias atuais – pandemia – municiará as relações contratuais, com a possibilidade de aplicação da teoria da imprevisão mediante assessoramento jurídico adequado, com vista à obtenção da rescisão contratual (art. 478, do Código Civil) ou modificações equitativas – reequilíbrio contratual (art. 421; 421-A e 479, todos do Código Civil), sendo primordial que tais soluções sejam buscadas quando realmente a relação contratual for impactada, sob pena de afronta ao princípio da boa-fé.


Frise-se e que se tenha a consciência de que a situação do COVID-19 traz diversas circunstâncias que deverão ser analisas no caso a caso, sendo recomendável a negociação entre as partes contratantes para, de boa-fé, buscarem uma solução consensual a fim de evitar-se um litigio

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